Evangelho do dia: (João 18,1-19,42)
Louvor e honra a vós, Senhor Jesus.
Jesus Cristo se torno obediente, obediente até a morte numa cruz; pelo que o Senhor Deus o exaltou e deu-lhe um nome muito acima de outro nome (Fl 2,8s).
N: Narrador
P: Presidente
G: Grupo ou assembléia
L: Leitor
Paixão de nosso Senhor Jesus Cristo segundo João.
N: Naquele tempo, 1 Jesus saiu com os seus discípulos para além da torrente de Cedron, onde havia um jardim, no qual entrou com os seus discípulos. 2 Judas, o traidor, conhecia também aquele lugar, porque Jesus ia freqüentemente para lá com os seus discípulos. 3 Tomou então Judas a coorte e os guardas de serviço dos pontífices e dos fariseus, e chegaram ali com lanternas, tochas e armas. 4 Como Jesus soubesse tudo o que havia de lhe acontecer, adiantou-se e perguntou-lhes:
P: A quem buscais?
N: 5 Responderam:
G: A Jesus de Nazaré.
N: Jesus respondeu:
P: Sou eu.
N: Também Judas, o traidor, estava com eles. 6 Quando lhes disse Sou eu, recuaram e caíram por terra. 7 Perguntou-lhes ele, pela segunda vez:
P: A quem buscais?
N: Disseram:
P: A Jesus de Nazaré.
N: 8 Replicou Jesus:
P: Já vos disse que sou eu. Se é, pois, a mim que buscais, deixai ir estes.
N: 9 Assim se cumpriu a palavra que disse: “Dos que me deste não perdi nenhum”. 10 Simão Pedro, que tinha uma espada, puxou dela e feriu o servo do sumo sacerdote, decepando-lhe a orelha direita. O servo chamava-se Malco. 11 Mas Jesus disse a Pedro:
P: Enfia a tua espada na bainha! Não hei de beber eu o cálice que o Pai me deu?
N: 12 Então a corte, o tribuno e os guardas dos judeus prenderam Jesus e o ataram. 13 Conduziram-no primeiro a Anás, por ser sogro de Caifás, que era o sumo sacerdote daquele ano. Caifás fora quem dera aos judeus o conselho: Convém que um só homem morra em lugar do povo. 15 Simão Pedro seguia Jesus, e mais outro discípulo. Este discípulo era conhecido do sumo sacerdote e entrou com Jesus no pátio da casa do sumo sacerdote, porém 16 Pedro ficou de fora, à porta. Mas o outro discípulo, que era conhecido do sumo sacerdote, saiu e falou à porteira, e esta deixou Pedro entrar. 17 A porteira perguntou a Pedro:
L: Não és acaso também tu dos discípulos desse homem?
N: Respondeu Pedro:
L: Não o sou.
N: 18 Os servos e os guardas acenderam um fogo, porque fazia frio, e se aqueciam. Com eles estava também Pedro, de pé, aquecendo-se. 19 O sumo sacerdote indagou de Jesus acerca dos seus discípulos e da sua doutrina. 20 Jesus respondeu-lhe:
P: Falei publicamente ao mundo. Ensinei na sinagoga e no templo, onde se reúnem os judeus, e nada falei às ocultas. 21 Por que me perguntas? Pergunta àqueles que ouviram o que lhes disse. Estes sabem o que ensinei.
N: 22 A estas palavras, um dos guardas presentes deu uma bofetada em Jesus, dizendo: É assim que respondes ao sumo sacerdote? Replicou-lhe Jesus:
P: 23 Se falei mal, prova-o, mas se falei bem, por que me bates?
N: 24 Anás enviou-o preso ao sumo sacerdote Caifás. 25 Simão Pedro estava lá se aquecendo. Perguntaram-lhe:
G: Não és porventura, também tu, dos seus discípulos?
N: Pedro negou:
L: Não!
N: 26 Disse-lhe um dos servos do sumo sacerdote, parente daquele a quem Pedro cortara a orelha:
L: Não te vi eu com ele no horto?
N: 27 Mas Pedro negou-o outra vez, e imediatamente o galo cantou. 28 Da casa de Caifás conduziram Jesus ao pretório. Era de manhã cedo. Mas os judeus não entraram no pretório, para não se contaminarem e poderem comer a Páscoa. 29 Saiu, por isso, Pilatos para ter com eles, e perguntou:
L: Que acusação trazeis contra este homem?
N: 30 Responderam-lhe:
G: Se este não fosse malfeitor, não o teríamos entregue a ti.
N: 31 Disse, então, Pilatos:
L: Tomai-o e julgai-o vós mesmos segundo a vossa lei.
N: Responderam-lhe os judeus:
G: Não nos é permitido matar ninguém.
N: 32 Assim se cumpria a palavra com a qual Jesus indicou de que gênero de morte havia de morrer. 33 Pilatos entrou no pretório, chamou Jesus e perguntou-lhe:
L: És tu o rei dos judeus?
N: 34 Jesus respondeu:
P: Dizes isso por ti mesmo, ou foram outros que to disseram de mim?
N: 35 Disse Pilatos:
L: Acaso sou eu judeu? A tua nação e os sumos sacerdotes entregaram-te a mim. Que fizeste?
N: 36 Respondeu Jesus:
P: O meu Reino não é deste mundo. Se o meu Reino fosse deste mundo, os meus súditos certamente teriam pelejado para que eu não fosse entregue aos judeus. Mas o meu Reino não é deste mundo.
N: 37 Perguntou-lhe então Pilatos:
L: És, portanto, rei?
N: Respondeu Jesus:
P: Sim, eu sou rei. É para dar testemunho da verdade que nasci e vim ao mundo. Todo o que é da verdade ouve a minha voz.
N: 38 Disse-lhe Pilatos:
L: O que é a verdade?
N: Falando isso, saiu de novo, foi ter com os judeus e disse-lhes:
L: Não acho nele crime algum. 39 Mas é costume entre vós que pela Páscoa vos solte um preso. Quereis, pois, que vos solte o rei dos judeus?
N: 40 Então todos gritaram novamente e disseram:
G: 19 1 Não! A este não! Mas a Barrabás!
N: Barrabás era um salteador. Pilatos mandou então flagelar Jesus. 2 Os soldados teceram de espinhos uma coroa e puseram-lha sobre a cabeça e cobriram-no com um manto de púrpura. 3 Aproximavam-se dele e diziam:
G: Salve, rei dos judeus!
N: E davam-lhe bofetadas. 4 Pilatos saiu outra vez e disse-lhes:
L: Eis que vo-lo trago fora, para que saibais que não acho nele nenhum motivo de acusação.
N: 5 Apareceu então Jesus, trazendo a coroa de espinhos e o manto de púrpura. Pilatos disse:
L: Eis o homem!
N: 6 Quando os pontífices e os guardas o viram, gritaram:
G: Crucifica-o! Crucifica-o!
N: Falou-lhes Pilatos:
L: Tomai-o vós e crucificai-o, pois eu não acho nele culpa alguma.
N: Responderam-lhe os judeus:
G: 7 Nós temos uma lei, e segundo essa lei ele deve morrer, porque se declarou Filho de Deus.
N: 8 Estas palavras impressionaram Pilatos. 9 Entrou novamente no pretório e perguntou a Jesus:
L: De onde és tu?
N: Mas Jesus não lhe respondeu. 10 Pilatos então lhe disse:
L: Tu não me respondes? Não sabes que tenho poder para te soltar e para te crucificar?
N: 11 Respondeu Jesus:
P: Não terias poder algum sobre mim, se de cima não te fora dado. Por isso, quem me entregou a ti tem pecado maior.
N: 12 Desde então Pilatos procurava soltá-lo. Mas os judeus gritavam:
G: Se o soltares, não és amigo do imperador, porque todo o que se faz rei se declara contra o imperador.
N: 13 Ouvindo estas palavras, Pilatos trouxe Jesus para fora e sentou-se no tribunal, no lugar chamado Lajeado, em hebraico Gábata. 14 Era a Preparação para a Páscoa, cerca da hora sexta. Pilatos disse aos judeus:
L: Eis o vosso rei!
N: 15 Mas eles clamavam:
G: Fora com ele! Fora com ele! Crucifica-o!
N: Pilatos perguntou-lhes:
L: Hei de crucificar o vosso rei?
N: Os sumos sacerdotes responderam:
G: Não temos outro rei senão César!
N: 16 Entregou-o então a eles para que fosse crucificado. Levaram então consigo Jesus. 17 Ele próprio carregava a sua cruz para fora da cidade, em direção ao lugar chamado Calvário, em hebraico Gólgota. 18 Ali o crucificaram, e com ele outros dois, um de cada lado, e Jesus no meio. 19 Pilatos redigiu também uma inscrição e a fixou por cima da cruz. Nela estava escrito: “Jesus de Nazaré, rei dos judeus”. 20 Muitos dos judeus leram essa inscrição, porque Jesus foi crucificado perto da cidade e a inscrição era redigida em hebraico, em latim e em grego. 21 Os sumos sacerdotes dos judeus disseram a Pilatos:
G: Não escrevas: “Rei dos judeus”, mas sim: “Este homem disse ser o rei dos judeus”.
N: 22 Respondeu Pilatos:
L: O que escrevi, escrevi.
N: 23 Depois de os soldados crucificarem Jesus, tomaram as suas vestes e fizeram delas quatro partes, uma para cada soldado. A túnica, porém, toda tecida de alto a baixo, não tinha costura. 24 Disseram, pois, uns aos outros:
G: Não a rasguemos, mas deitemos sorte sobre ela, para ver de quem será.
N: Assim se cumpria a Escritura: “Repartiram entre si as minhas vestes e deitaram sorte sobre a minha túnica”. Isso fizeram os soldados. 25 Junto à cruz de Jesus estavam de pé sua mãe, a irmã de sua mãe, Maria, mulher de Cléofas, e Maria Madalena. 26 Quando Jesus viu sua mãe e perto dela o discípulo que amava, disse à sua mãe:
P: Mulher, eis aí teu filho.
N: 27 Depois disse ao discípulo:
P: Eis aí tua mãe.
N: E dessa hora em diante o discípulo a levou para a sua casa. 28 Em seguida, sabendo Jesus que tudo estava consumado, para se cumprir plenamente a Escritura, disse:
P: Tenho sede.
N: 29 Havia ali um vaso cheio de vinagre. Os soldados encheram de vinagre uma esponja e, fixando-a numa vara de hissopo, chegaram-lhe à boca. 30 Havendo Jesus tomado do vinagre, disse:
P: Tudo está consumado.
N: Inclinou a cabeça e rendeu o espírito.
VOCÊ TAMBÉM JÁ FOI ALCANÇADO (A)
Reflexão Padre Paulo Mazzi
Adoração da Cruz. Palavra de Deus: Isaías 52,13 – 53,12; Hebreus 4,14-16; 5,7-9; João 18,1 – 19,42.
A ciência e a tecnologia nos prometem um mundo e um futuro sem dor, um mundo e um futuro onde não haverá mais acidentes (tudo será controlado por computadores, inclusive os carros), onde as doenças não serão apenas curadas, mas mesmo impedidas de se manifestarem, graças à manipulação genética. Sonha-se com um mundo e um futuro onde – quem sabe – a própria morte será eliminada! No entanto, o mesmo ser humano que busca formas de não sofrer e de não morrer, produz sofrimento e morte; o mesmo ser humano que sente repulsa da cruz produz situações de cruz para si mesmo e para o seu semelhante.
A liturgia desta tarde de sexta-feira santa nos coloca diante da Cruz. Ela não é um símbolo inofensivo. Na verdade, a Cruz sempre provoca uma reviravolta em nossa maneira de compreender Deus e a própria vida. Ela nos lembra que os caminhos que Deus usa para nos salvar são muito diferentes do que aqueles que imaginamos. Além disso, quando pensamos que o sentido da nossa vida está em ter sempre boa saúde, superar todas as dificuldades, obter todas as respostas, resolver todos os problemas e sermos bem sucedidos em tudo o que fazemos, a Cruz fere o nosso orgulho e abate a nossa autossuficiência, nos lembrando de que nenhum ser humano se salva por sua própria força.
Mas há um lado positivo em tudo isso. Ao derrubar nosso orgulho e nossa autossuficiência no chão, ao desmontar os nossos esquemas, a Cruz nos faz enxergar que até mesmo quando fracassamos aos olhos dos homens, até mesmo quando descemos no mais fundo do poço, justamente ali pode ser dar a nossa redenção, a nossa cura, a nossa salvação. Como escreveu o Pe. Amedeu Cencini, “desde que Cristo morreu na cruz, toda situação, inclusive a mais frágil e trágica ou a aparentemente falimentar e maldita, pode tornar-se lugar e causa de salvação”. Desde que Cristo sofreu e morreu na cruz, toda dor que você sofre e toda morte que você enfrenta podem se tornar experiências de redenção, de cura e de salvação para você e para a humanidade.
Nesta tarde, nós não olhamos apenas para a Cruz, mas, sobretudo, para o Crucificado: “Tão desfigurado ele estava que não parecia ser um homem ou ter aspecto humano. Não tinha beleza nem atrativo para o olharmos, não tinha aparência que nos agradasse” (Is 53,2). Porque somos influenciados pela cultura da aparência, nós desviamos o olhar de tudo o que é feio, de tudo o que nos lembra fraqueza, imperfeição, dor, envelhecimento e morte. Mas o Crucificado nos ensina que também fazem parte da vida o deficiente, o fraco, o imperfeito, aquilo que consideramos feio, desprezível e sem importância. Se nós queremos ser curados, precisamos aprender a ouvir as nossas feridas, e não fazer de conta que elas não existem. Se nós queremos um mundo melhor, precisamos ouvir o grito dos crucificados, e não ignorá-los.
O Crucificado “era desprezado como o último dos mortais, homem coberto de dores, cheio de sofrimentos… A verdade é que ele tomava sobre si nossas enfermidades e sofria, ele mesmo, nossas dores” (Is 53,3.4). A verdade é que nós achamos que o sofrimento do outro é problema dele e não nosso. A verdade é que nós sempre achamos que as coisas ruins podem acontecer com os outros, nunca conosco. A verdade é que nós esperamos que Deus “funcione” para nós como blindagem diante de todo tipo sofrimento. A verdade é que nós, muito diferente de Jesus, procuramos afastar de todas as maneiras o cálice da dor, esquecendo-nos de que este cálice pode contar o remédio amargo para nos curar, a correção necessária para nos resgatar e nos devolver ao caminho da justiça, da santidade e da salvação. A verdade é que muitos de nós estamos criando as futuras gerações num mundo de mentiras, onde não há dor, nem luta, nem sacrifício, nem frustração, nem morte, um mundo onde tudo é fácil: basta fazer manha, fazer chantagem, fazer corpo mole, e as dificuldades desaparecerão.
Ao profetizar a sua morte de cruz, Jesus havia dito: “Quando eu for elevado da terra, atrairei todos a mim” (Jo 12,32). O que nos atrai para o Crucificado é a sua atitude de recolher em si toda dor, todo sofrimento, toda morte, e entregar tudo ao Pai, o único que pode transformar a dor em alegria, a morte em vida. O que nos atrai para o Crucificado é reconhecê-Lo como o Divino Pontífice, a ponte que foi estendida entre o céu e a terra, para reconciliar o homem com Deus. Havia um abismo que separava a humanidade de Deus (cf. Is 59,1-2), mas sobre este abismo foi deitada a Cruz do Crucificado. Por isso, o autor da carta aos Hebreus nos convida: “Permaneçamos firmes na fé que professamos. Com efeito, temos um sumo sacerdote capaz de se compadecer de nossas fraquezas… Aproximemo-nos então, com toda a confiança, do trono da graça, para conseguirmos misericórdia e alcançarmos a graça de um auxílio no momento oportuno” (Hb 4,14-16).
A Cruz tornou-se para nós o trono da graça, porque Aquele que nela esteve crucificado agora está vivo e ressuscitado diante do Pai, intercedendo por nós dia e noite (cf. Hb 7,24-25). Ainda que, como Ele, nós às vezes nos sintamos como um vaso despedaçado pelo sofrimento, podemos dirigir confiantemente nossa oração ao Pai, como Jesus mesmo rezou: “A vós, porém, ó meu Senhor, eu me confio, e afirmo que só vós sois o meu Deus! Eu entrego em vossas mãos o meu destino; libertai-me do inimigo e do opressor! Mostrai serena a vossa face ao vosso servo e salvai-me pela vossa compaixão!” (Sl 31,15-17).
Ao finalizar esta reflexão, podemos nos perguntar: qual é o alcance da Cruz de Cristo? Por quem Ele morreu? Quem a sua morte redimiu? Sabemos que Ele morreu por todos, para reunir todos os filhos de Deus dispersos pela terra (cf. Jo 11,52). Todo ser humano está salvo pela Cruz de Cristo porque todo ser humano foi “alcançado” pela redenção realizada na Cruz. Foi isso que o apóstolo Paulo compreendeu, ao declarar: “eu também já fui alcançado por Cristo Jesus” (Fl 3,12). Uma vez que nós todos fomos alcançados pela força redentora da Cruz de nosso Senhor Jesus, que possamos viver com a mesma disposição de fé e a mesma consciência que o apóstolo Paulo viveu: “Tudo considero como algo sem valor em comparação ao conhecimento de Jesus Cristo. Quero ganhar a Cristo e ser achado nele. Quero conhecê-lo, conhecer o poder da sua ressurreição e a participação nos seus sofrimentos, conformando-me com ele na sua morte, para ver se alcanço a ressurreição de entre os mortos” (Fl 3,8-11).