Seguidoras e seguidores de Jesus,
Quinta-feira Santa.
Peçamos ao Senhor para sermos envolvidos também nós, nesta tarde-noite, completamente na celebração, para que possamos oferecer os nossos corpos, como dizia S. Paulo, “como sacrifício vivo, santo e agradável a Deus”. Este é o culto que nos é pedido: oferecer os nossos corpos, para que pelo menos em algum momento, em algum espaço, em algum âmbito de nossa vida, a ação de Deus possa tornar-se amor até o fim.
Com a bênção de Deus sob o manto de Nossa Senhora.
- Agenor Sbaraini, CS
Missa da Ceia do Senhor.
Palavra de Deus: Êxodo 12,1-8.11-14; 1Coríntios 11,23-26; João 13,1-15.
Evangelho do dia: (João 13,1-15)
Glória a vós, ó Cristo, Verbo de Deus.
Eu vos dou este novo mandamento, nova ordem agora vos dou, que, também, vos ameis uns aos outros, como eu vos amei, diz o Senhor (Jo 13,34).
Proclamação do Evangelho de Jesus Cristo segundo João.
13 1 Antes da festa da Páscoa, sabendo Jesus que chegara a sua hora de passar deste mundo ao Pai, como amasse os seus que estavam no mundo, até o extremo os amou.
2 Durante a ceia, – quando o demônio já tinha lançado no coração de Judas, filho de Simão Iscariotes, o propósito de traí-lo -,
3 sabendo Jesus que o Pai tudo lhe dera nas mãos, e que saíra de Deus e para Deus voltava,
4 levantou-se da mesa, depôs as suas vestes e, pegando duma toalha, cingiu-se com ela.
5 Em seguida, deitou água numa bacia e começou a lavar os pés dos discípulos e a enxugá-los com a toalha com que estava cingido.
6 Chegou a Simão Pedro. “Mas Pedro lhe disse: Senhor, queres lavar-me os pés!”
7 Respondeu-lhe Jesus: “O que faço não compreendes agora, mas compreendê-lo-ás em breve”.
8 Disse-lhe Pedro: “Jamais me lavarás os pés!” Respondeu-lhe Jesus: “Se eu não tos lavar, não terás parte comigo”.
9 Exclamou então Simão Pedro: “Senhor, não somente os pés, mas também as mãos e a cabeça”.
10 Disse-lhe Jesus: “Aquele que tomou banho não tem necessidade de lavar-se; está inteiramente puro. Ora, vós estais puros, mas nem todos!”
11 Pois sabia quem o havia de trair; por isso, disse: “Nem todos estais puros”.
12 Depois de lhes lavar os pés e tomar as suas vestes, sentou-se novamente à mesa e perguntou-lhes: “Sabeis o que vos fiz?
13 Vós me chamais Mestre e Senhor, e dizeis bem, porque eu o sou.
14 Logo, se eu, vosso Senhor e Mestre, vos lavei os pés, também vós deveis lavar-vos os pés uns aos outros.
15 Dei-vos o exemplo para que, como eu vos fiz, assim façais também vós”.
Palavra da Salvação.
Reflexão de P. Paulo Mazzi
A liturgia desta noite nos fala da preparação de duas páscoas: a páscoa do Antigo Testamento, quando o Senhor Deus passou pela terra do Egito e convidou seu povo (Israel) a fazer a passagem da escravidão para a liberdade, e a Páscoa do Novo Testamento, quando Jesus abraçou a sua hora de passar deste mundo para o Pai, oferecendo a todos os que n’Ele creem a possibilidade de passarem da morte para a vida. Duas páscoas muito diferentes, mas com um personagem central comum a ambas: o cordeiro.
Na páscoa do Antigo Testamento, Deus ordenou às famílias dos hebreus: “Cada um tome um cordeiro por família, um cordeiro por casa” (Ex 12,3). “Tomareis um pouco do seu sangue e untareis os marcos e a travessa da porta, nas casas em que o comerdes” (Ex 12,7). “E comereis às pressas, pois é a Páscoa do Senhor, isto é, a ‘passagem’ do Senhor! Naquela noite, passarei pela terra do Egito e ferirei todos os primogênitos” (Ex 12,11-12). O pano de fundo dessa atitude de passar o sangue do cordeiro nas portas das casas vem de uma prática muito antiga dos pastores que, ao terem que percorrer os campos com seus rebanhos, sacrificavam um cordeiro e levavam um pouco do seu sangue à frente, como que abrindo o caminho, na esperança de que esse sangue afugentasse algum tipo de praga que pudesse ferir o rebanho de morte.
O sangue que os hebreus passaram nas portas de suas casas recordava, antes de mais nada, o sangue de inúmeros hebreus que o Egito derramou, por meio da escravidão, de trabalhos forçados, de violência e de morte, para impedir que se multiplicasse e crescesse (cf. Ex 1,8-16). Mas esse sangue já remetia para o sangue de Jesus na cruz, o verdadeiro Cordeiro que morreria para reunir todos os filhos de Deus dispersos (cf. Jo 11,52). O fato é que o sangue nas portas das casas tornou-se um sinal de proteção para os hebreus: “O sangue servirá de sinal nas casas em que estiverdes. Ao ver o sangue, passarei adiante, e não vos atingirá a praga exterminadora quando eu ferir a terra do Egito” (Ex 12,13).
Diante da páscoa do Antigo Testamento, nós precisamos nos perguntar: quais são as pragas que hoje ameaçam exterminar nossas crianças e nossos jovens? Quais são as pragas que podem exterminar o casamento, a família, as escolas, nossas cidades, nosso mundo? Qual sinal precisamos ter em nossa casa para que o espírito maligno reconheça que pertencemos a Deus e não atente contra nós? Mais do que as portas das nossas casas, é a porta da nossa consciência que precisa ser assinalada com o sangue de Jesus Cristo, o Cordeiro de Deus, sangue que é expressão do seu amor por nós: “tendo amado os seus que estavam no mundo, amou-os até o fim” (Jo 13,1). Quando nos dispomos a amar até o fim aqueles ou a missão que o Senhor nos confiou, o espírito exterminador não encontra espaço para se alojar em nós.
Deus havia dado uma ordem aos hebreus: “Este dia… haveis de celebrar, por todas as gerações, como uma memória perpétua” (Ex 12,14). Enquanto o povo de Israel se preparava para celebrar a páscoa, Jesus começou a preparar a “sua” Páscoa: “Era antes da festa da Páscoa. Jesus sabia que tinha chegado a sua hora de passar deste mundo para o Pai; tendo amado os seus que estavam no mundo, amou-os até o fim” (Jo 13,1). Antes de seu corpo ser doado e seu sangue ser derramado na cruz, “o Senhor Jesus tomou o pão (…), partiu-o e disse: ‘Isto é o meu corpo, que é dado por vós. Fazei isto em minha memória’. Do mesmo modo, depois da ceia, tomou também o cálice e disse: ‘Este cálice é a nova aliança, em meu sangue. Todas as vezes que dele beberdes, fazei isto em memória de mim’ (1Cor 11,25).
A Páscoa que Jesus celebra com seus discípulos é infinitamente superior à páscoa do Antigo Testamento, pois ele é o Cordeiro que se oferece livre e conscientemente para a salvação não só do povo de Israel, mas de toda a humanidade. Enquanto inúmeros cordeiros morreram sem saberem o porquê, ao longo dos séculos, Jesus é o Cordeiro que decide livremente nos amar até o fim, tornando-se “corpo doado e sangue derramado” em favor da nossa salvação. Seu sangue é um sangue consciente, e justamente por isso, capaz de operar a redenção eterna, como está escrito: “não com o sangue de bodes e bezerros, mas com o seu próprio sangue, ele entrou no Santuário uma vez por todas, obtendo uma redenção eterna” (Hb 9,12).
Agora a pouco, cantávamos no salmo: “O cálice por nós abençoado é a nossa comunhão com o sangue do Senhor”. A nossa comunhão com o sangue do Senhor significa a nossa comunhão com o seu amor que ama até o fim, uma comunhão que nos convida a fazer de nós mesmos “hóstias vivas”, homens e mulheres que façam da sua existência uma “vida para”, cristãos que se tornem “corpo doado e sangue derramado”, para a salvação da humanidade. Foi por isso que Jesus, na última Ceia, realizou o lava-pés, como acabamos de ouvir no Evangelho: Ele “levantou-se da mesa, tirou o manto, pegou uma toalha e amarrou-a na cintura. Derramou água numa bacia e começou a lavar os pés dos discípulos, enxugando-os com a toalha com que estava cingido” (Jo 13,4-5). Ao final desse gesto, disse aos discípulos: “Se eu, o Senhor e mestre, vos lavei os pés, também vós deveis lavar os pés uns dos outros. Dei-vos o exemplo, para que façais a mesma coisa que eu fiz” (Jo 13,14-15).
Nós, cristãos, somos discípulos do Cordeiro; somos cordeiros vivendo no meio de lobos (cf. Lc 10,3), cordeiros chamados a não se corromperem em lobos como forma de sobrevivência, mas a testemunharem a vitória do Cordeiro que, depois de ter sido sacrificado na cruz, encontra-se agora em pé, à direita do trono de Deus, ressuscitado e vitorioso (cf. Ap 5,6); somos cordeiros chamados a oferecer o nosso sangue, no sentido de trabalhar e lutar pela redenção da humanidade, ajudando a poupar inúmeras casas, famílias, pessoas, doe todo tipo de espírito exterminador; enfim, somos cordeiros que nesta noite de preparação para a Páscoa se alimentam do Corpo e do Sangue do nosso Pastor, proclamando a sua morte redentora em favor da humanidade, até que Ele venha para realizar a Páscoa definitiva conosco (cf. 1Cor 11,26).